Apagão no Amapá escancara a realidade da privatização: O que importa é lucro
Publicada dia 17/11/2020 14:17
A população do Estado ficou no escuro porque a empresa fornecedora de energia, uma instituição privada e estrangeira, falhou na manutenção e não investiu na estrutura de reserva, desenvolvida para evitar justamente as falhas de distribuição.
O apagão que atingiu mais de 80% do estado do Amapá deixou claro como os processos de privatização trazem enormes problemas para a parte mais sensível às mudanças, que é justamente a população.
O episódio também ensina os efeitos de abdicar de um monopólio público para apostar em na ação de empresas privadas sobre setores estratégicos da nossa infraestrutura.
O ocorrido se deu por falta de coordenação, de capacidade diretiva, de manutenção e de investimento e, claro, de empatia com a população Amapaense.
No setor elétrico, os acidentes e problemas técnicos fazem parte da rotina. Apesar de não programados, quem opera no setor sabe que esse tipo de situação é inevitável, afinal, trabalhar com energia é algo que, em certos casos, oferece cenários imprevisíveis.
Por essa razão, as empresas devem trabalhar com algo que os especialistas chama de sistema de redundância. Esse sistema funciona de forma paralela como uma reserva que deve entrar em ação somente no caso de uma emergência, tudo para não deixar a população desassistida.
No Amapá houve uma explosão na subestação de distribuição de energia, não por raio como divulgado a princípio, mas por falta de manutenção, e o sistema paralelo não estava funcionando e não entrou em operação, por falta de investimento.
Tudo pelo lucro
É comum acontecer isso. As empresas privadas, depois que dominam o setor que lhes interessam, só investem no que leva à manutenção das taxas de lucro. Por isso a privatização não funciona.
Não é verdade que uma empresa privada funciona melhor que uma estatal, como pregam os defensores da privatização, principalmente quando o bem-estar e o direito da população está em jogo.
Além desse exemplo do Amapá, pode-se citar o recente acidente com a Vale do Rio Doce em Brumadinho. Os problemas nas barragens das minas são antigos, mas a empresa não fez investimento em segurança, porque não dá lucro. O resultado nós sabemos, não só em Brumadinho quanto em Mariana, e quem pagou caro por isso foi o meio ambiente e a população mineira.
Quem vai pagar a conta?
Os moradores do Amapá, um estado com dezenas de comunidades tradicionais, perderam carne, frango, peixe e polpas de frutas no apagão. Ainda foi preciso retomar métodos antigos de conservação dos alimentos, como salgar a carne, e voltar à luz da lamparina.
A falta de energia já era rotina nessas comunidades. Em um mês, nos lugares onde a eletricidade já chegou há mais de dez anos, são comuns três ou quatro blecautes, que duram dias. Agora o apagão agravou a situação e fez com que comunidades regredissem no usufruto de direitos conquistados ao longo de décadas.
Quem está tendo de fazer a manutenção para retomar o fornecimento de energia é a Eletronorte, empresa estatal do grupo Eletrobrás, que o governo quer privatizar.
De quem é a responsabilidade pelo sofrimento e os enormes prejuízos da população?
Muito se fala em culpa das agências reguladoras, como Anatel e Aneel (há, inclusive, proposta para criação de uma agência reguladora da logística de encomendas em caso de privatização dos Correios).
Mas, vamos pensar com calma. Até que ponto essas agências têm condições de fiscalizar o sistema? Qual é a estrutura delas? Existe uma cooperação das empresas do setor com as atividades regulatórias? Tudo isso parece bastante obscuro, especialmente no que diz respeito à contribuição das empresas com a fiscalização.
A situação é tão grave que o Tribunal de Contas da União (TCU) está apurando se houve algum tipo de omissão do poder público no incidente que levou ao apagão no Amapá, ou seja, será verificado se o governo e a agência reguladora deixaram de cumprir seu papel.
O próprio governo do estado já admitiu que um terceiro transformador da subestação, que deveria servir como backup, estava em manutenção desde dezembro.
Tudo isso antecipa o caos que será instalado no setor postal se a empresa de Correios estatal deixar de existir!
Você consegue imaginar que tipo de problema enfrentaremos quando o setor postal for liderado pelas exigências do mercado? Deixe seu comentário e compartilhe sua opinião conosco!
Veja análise em podcast de Fausto Augusto Jr, Diretor técnico do DIEESE